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Enfermagem

Consequências da Radioterapia na Região de Cabeça e Pescoço: Uma Revisão da Literatura

Fonte: Gabriela Botelho Martins ; LÔBO, Aylla Lorena Gomes . Consequências da radioterapia na região de cabeça e pescoço: Uma revisão de literatura. Revista Portuguesa de Estomatologia e Cirurgia Maxilofacial, v. 04, p. 251-255, 2009.

O cancro de boca é uma denominação que inclui os cancro de lábio e de cavidade oral, que envolve a mucosa bucal, gengiva, palato duro, língua e assoalho da boca. Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (2008), o cancro representa a 3ª causa de morte no Brasil, estima-se que nos anos de 2008 e 2009, serão diagnosticados mais de 14.160 novos casos de neoplasias da cavidade oral, entre homens e mulheres, em uma proporção de 3:1 para o sexo masculino.

Os principais tratamentos disponíveis para o controle dessas neoplasias são a cirurgia de cabeça e pescoço, a radioterapia e a quimioterapia, escolhidos de acordo com a localização, tipo histológico da neoplasia, estadiamento clínico e condições físicas do paciente. Geralmente a cirurgia é o tratamento de escolha, podendo ou não estar associada à radioterapia, sendo a quimioterapia utilizada de forma paliativa nos casos mais avançados. Porém, segundo Sonis (1996), apesar dos benefícios trazidos no tratamento do cancro com o uso da radioterapia, a mesma é capaz de provocar efeitos adversos nos campos de radiação, e em relação à cavidade bucal, as principais alterações ocorrem na pele, mucosa, ossos, glândulas salivares e dentes.

A radioterapia ocupa um lugar importante no tratamento dos carcinomas da região de cabeça e pescoço, e destrói tanto células tumorais como também normais, principalmente as células presentes em tecidos de mudança rápida, como é o caso do epitélio oral.

Entre os efeitos adversos mais comuns da radioterapia que atingem a cavidade oral, estão: mucosite, xerostomia, infecções secundárias, cáries por radiação, trismo, disgeusia e osteorradionecrose. Sendo assim, o médico dentista desempenha um papel importante na equipe multidisciplinar que atua no atendimento dos pacientes oncológicos, pois o mesmo deve participar do planeamento das diferentes fases de tratamento dessas lesões, além de acompanhar, preparar e orientar ao paciente no que diz respeito às sequelas provocadas pela terapia antineoplásica.

O objectivo desse trabalho é fazer uma revisão de literatura acerca das principais sequelas provenientes da radioterapia de cabeça e pescoço que acometem a cavidade oral dos pacientes oncológicos, além de reafirmar a importância do médico dentista na prevenção e controle das mesmas.

RADIOTERAPIA EM CABEÇA E PESCOÇO

A radioterapia, de um modo geral, pode ter três objetivos distintos: curativo, remissivo e sintomático. Quando o objectivo do tratamento é extinguir todas as células neoplásicas, diz-se que a radioterapia utilizada é de carácter curativo, quando se deseja reduzir parte do tumor ou complementar o tratamento cirúrgico ou quimioterápico, usa-se a remissiva; ao passo que, a finalidade sintomática das radiações é indicada nos casos de dor localizada. Nesses casos, as metástases ósseas são as mais beneficiadas no tratamento da dor, visto que as partes moles e os órgãos da cavidade peritoneal são menos favorecidos neste tipo de tratamento.

A prevalência e a intensidade das complicações orais ocasionadas durante o tratamento radioterápico vão depender da dose aplicada e do campo de incidência da radiação. Segundo Arisawa et al. (2005), as complicações orais decorrentes do tratamento antineoplásico ocorrem em aproximadamente 90% dos pacientes portadores de neoplasias malignas de cabeça e pescoço e estão relacionadas entre outros factores, com as doses e poder de penetração das radiações, além de respostas individuais de cada paciente. As células presentes na mucosa da cavidade oral, faringe e laringe possuem uma alta capacidade mitótica e baixa radiorresistência, por isso tornam-se alvos fáceis ao desenvolvimento de efeitos adversos causados pela exposição à radiação.

EFEITOS ADVERSOS DA RADIAÇÃO IONIZANTE NA REGIÃO DE CABEÇA E PESCOÇO

Os efeitos colaterais mais comuns da radioterapia na região de cabeça e pescoço são: dermatite, mucosite, xerostomia, disgeusia, disfagia, trismo, cárie de radiação, osteorradionecrose, os quais podem ser precoces e tardios, reversíveis ou irreversíveis.

Almeida et al., em 2004, realizaram um estudo com 30 pacientes portadores de carcinoma na cavidade oral e orofaringe, com o objectivo de avaliar as principais sequelas da radioterapia e propor um protocolo de prevenção e tratamento das mesmas. Os resultados mostraram que 17% dos pacientes irradiados apresentaram redução do fluxo salivar, 33% tiveram cárie de radiação, 75% desenvolveram trismo, e 67% apresentaram mucosite.

MUCOSITE ORAL

A mucosite é um dos primeiros sinais clínicos que aparecem na cavidade oral durante a radioterapia de cabeça e pescoço, iniciando geralmente durante a segunda semana de tratamento. Caracteriza-se por edema, eritema, ulceração, presença de pseudomembranas, além de dor e dificuldade na deglutição. Costuma causar desconforto e o paciente pode ser orientado a fazer bochechos com clorohexidina a 0,2% e aplicação de anestésico tópico no local atingido.

Albuquerque e Camargo, em 2006(11), realizaram uma revisão sistemática sobre mucosite oral com 33 artigos publicados entre 2000 e 2005. Avaliaram os diferentes níveis de intensidade de mucosite oral, além das principais intervenções e tratamentos mais recomendados na literatura, como orientações sobre higiene oral e dieta, uso de antifúngicos, antibióticos, complexos vitamínicos, além de soluções de clorohexidina e bicarbonato de sódio para bochechos diários. Como conclusão, consideraram que a mucosite é um dos efeitos adversos mais comuns do tratamento radioterápico, sendo caracterizada por uma inflamação na mucosa, com presença de eritema e ulceração, geralmente associada à dor e dificuldade de deglutição. Nos casos mais agressivos e dolorosos, é considerado um fator dose limitante na terapia antineoplásica.

XEROSTOMIA

A xerostomia é relatada como “sensação de boca seca”, e se inicia após a segunda semana de tratamento em uma dose de 2000 a 2500cGy aproximadamente. Ressaltando que, doses acima de 6000cGy provocam modificações quase sempre irreversíveis na produção e consistência salivar(10). Esta complicação muito comum da radioterapia ocorre devido à inclusão das glândulas salivares no campo de radiação. Estas estruturas, por serem radiossensíveis, sofrem prejuízo na sua função secretora por atrofia dos ácinos serosos, o que torna a saliva mais espessa e viscosa, além de prejudicar o seu efeito bactericida. Este fato favorece o crescimento da microbiota cariogénica e consequentemente o aparecimento de cárie secundária. Além disso, os pacientes se queixam de dificuldade de deglutição, provavelmente devido à reduzida lubrificação oral.

Guebur et al. (2004) avaliaram o fluxo salivar em 12 pacientes, fumantes, portadores de carcinoma espinocelular submetidos à radioterapia na região de cabeça e pescoço, com doses de radiação entre 5280 e 7040 cGy. Concluíram que 90% desses pacientes apresentaram uma diminuição considerável do fluxo salivar durante o tratamento.

Rubira et al. (2007) fizeram um estudo longitudinal com 100 pacientes portadores de neoplasias malignas de cabeça e pescoço, com o objectivo de identificar e avaliar os principais efeitos adversos na cavidade oral causados pela radioterapia. Os pacientes foram submetidos à anamnese, exame físico e exames complementares, como sialometria, medida do pH salivar e radiografia panorâmica. A amostra do estudo recebeu uma dose média de radiação de 5955 cGy. Foi possível observar que 30% dos pacientes relataram a perda total de paladar, com doses mais altas que 5000cGy, e 38 pacientes relataram dificuldades de deglutição, sintoma que caracteriza a disfagia, com uma dose média de radiação em torno de 6063cGy e campos de radiação que incluíram a região da orofaringe. Este estudo sugere que os efeitos da radioterapia persistem ao longo dos anos e dependem de um jogo das variáveis que incluem o campo de radia- ção, o uso de medicação para alívio da xerostomia, a dose de radiação e o tempo pós-radioterapia de avaliação do paciente. Apesar de uma leve melhora do fluxo salivar ao final do tratamento radioterápico, a redução salivar ainda continua sendo um dos principais efeitos colaterais da radioterapia nesta região.

INFECÇÕES FÚNGICAS E BACTERIANAS

Em pacientes debilitados devido à terapia para o cancro, podem ocorrer infecções bacterianas, fúngicas ou virais, que devem ser diagnosticadas e tratadas precocemente para evitar o envolvimento sistêmico desses indivíduos, podendo ser fatal.

A infecção bacteriana presente na cavidade oral apresenta como principais sinais e sintomas dor, febre acima de 38ºC e lesões na mucosa e gengiva. As infecções odontogênicas são manifestadas através de episódios de dor relacionados à presença de cárie profunda, sensibilidade do dente à percussão e mudanças de temperatura. Por outro lado, a infecção viral, principalmente aquela causada pelo herpes simples e herpes zoster, tem sido observada com frequência em pacientes oncológicos, com manifestações intra e extrabucais, presença de eritema, lesões agrupadas e ulceradas que podem aparecer no palato, comissuras labiais ou abaixo do nariz.

Buscando investigar a colonização por cândida associada à redução do fluxo salivar antes, durante e após a radioterapia cervicofacial, Bonan et al., em 2007, fizeram um estudo com 20 pacientes portadores de neoplasias malignas de cabeça e pescoço com indicação de radioterapia, sendo 24 pacientes saudá- veis e 09 pacientes já submetidos a radioterapia por no mínimo um ano. Como resultado desse estudo, foi observado que os pacientes irradiados apresentaram redução de fluxo salivar, aumento na colonização fúngica principalmente por C. albicans e C. Tropicalis, e diversificação das espécies de cândida presentes ao longo do tratamento.

Outra complicação frequente observada nos pacientes em terapia antineoplásica, são as cáries de radiação, caracterizadas por possuírem uma rápida progressão, atingindo as superfícies lisas das regiões cervicais dos dentes devido à redução significativa do fluxo salivar, tornando-os mais susceptíveis ao acúmulo de biofilme dental e agregação da microbiota cariogênica na superfície.

Em um estudo com 92 pacientes, irradiados e não irradiados, com o objectivo de avaliar o índice de CPOD (dentes cariados, perdidos e obturados) e presença de xerostomia, foi constatado que este índice apresentou diferenças significativas entre os grupos, onde foi mais elevado no grupo teste, excepto no que diz respeito ao escore correspondente a dente extraído. A xerostomia foi avaliada através da aplicação de um questionário, no qual os pacientes relatavam ou não a sensação de boca seca e dificuldade de deglutição, onde foi observada com maior frequência nos pacientes irradiados.

TRISMO

O trismo está relacionado às neoplasias malignas localizadas na região retromolar e palato mole, ocorrendo devido à exposição da articulação temporomandibular (ATM) e músculos mastigatórios às radiações, causando a fibrose gradual dos feixes musculares envolvidos. O paciente costuma relatar como primeiro sintoma a dificuldade de abertura de boca, fato que compromete a higiene oral do mesmo.

OSTEORRADIONECROSE

Osteorradionecrose é uma sequela tardia da radioterapia, que apresenta incidência de aproximadamente 40% nos pacientes irradiados na região de cabeça e pescoço, mais frequentemente identificada naqueles indivíduos que recebem doses acima de 6500 Gy, e se caracteriza pela destruição do tecido cutâneo da boca e consequente exposição do tecido ósseo necrótico, variando entre 3 e 6 meses. Após a exposição óssea, existe o desencadeamento de uma série de outros sinais e sintomas clínicos, como: fístulas orais ou cutâneas, drenagem de secreção purulenta, algia, dificuldade mastigatória, e trismos musculares. Os casos mais agressivos de osteorradionecrose podem evoluir rapidamente para fractura patológica do osso afectado.

Segundo Monteiro et al. (2005), a osteorradionecrose é causada por uma necrose óssea isquêmica induzida pela radiação, onde o tecido ósseo tem a sua capacidade de remodelação e cicatrização prejudicada em carácter permanente. Dentre as suas consequências, é possível observar desde dor severa a osteomielites secundárias, alterações mastigatórias e fonéticas, além de infecções sistêmicas, comprometendo a qualidade de vida.

Em 2005, Cardoso et al. realizaram um estudo longitudinal por 180 dias com 12 pacientes portadores de neoplasias malignas de cabeça e pescoço, acompanhados através da elaboração prévia de um plano de tratamento sistematizado referente às condições de saúde oral, executado antes, durante e no mínimo seis meses após a radioterapia. No exame intra oral, notou-se, de um modo geral, que os pacientes apresentavam cáries extensas, lesões periapicais, fístulas e mobilidade. O tratamento prévio foi executado o mais breve possível, além da prescrição de bochechos de clorohexidina a 0,2% e orientações de higiene oral. Ao final do estudo, foi observado que o acompanhamento odontológico sistemático contribuiu para promover melhores condições de restabelecimento em pacientes portadores de neoplasias malignas de cabeça e pescoço que se submetem à radioterapia.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A radioterapia na região de cabeça e pescoço, poderá acarretar uma série de efeitos adversos na cavidade oral. Dessa forma, se faz necessária a presença do médico dentista na equipe multidisciplinar de atendimento do paciente oncoló- gico, no intuito de desenvolver um planeamento individualizado e sistematizado para esse indivíduo, orientando-o quanto a prevenção e tratamento dos efeitos secundários da radioterapia. Além disso, é de suma importância, que os radioterapeutas envolvidos no processo multidisciplinar de atendimento, tenham conhecimento dessas sequelas e estabele- çam um fluxo de encaminhamento desses pacientes para centros odontológicos de referência, buscando minimizar e tratar os efeitos adversos que poderão surgir na cavidade oral, além de promover um acompanhamento contínuo que possa resgatar as condições ideais de saúde, contribuindo para a qualidade de vida e autoestima desses pacientes.

 

 

 

 

O envelhecimento na perspectiva do cuidador de idosos (Parte II)

Fonte: Garbin, Cléa Adas SalibaSUMIDA, Doris Hissako ; MOIMAZ, S. A. S. ; PRADO, Rosana Leal Do ; Silva, Milene Moreira da . O envelhecimento na perspectiva do cuidador de idosos. Ciência e Saúde Coletiva (Impresso), v. 15, p. 2941-2948, 2010.

 

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As dificuldades que eu vejo estão aí na frente: maus-tratos, desrespeito em diversas áreas, familiares que não aceitam um idoso dentro de casa dando um pouco mais de trabalho, dependente de tudo, não enxergando direito, sem forças para andar sozinho, é debilitado. O velho enfrenta a solidão, o preconceito, as doenças. Quando tem Alzheimer sofre menos porque perde a noção de tudo o que está acontecendo. Quando é lúcido é pior porque entende tudo, tem que ficar no asilo, tem medo das pessoas. Para cuidar de idosos acamados ou em cadeiras de rodas é preciso paciência.

Todas as mudanças consequentes do próprio envelhecimento acarretam desgaste tanto para o idoso quanto para o cuidador, do qual são requeridos paciência, habilidade e conhecimento para lidar com a situação. Uma vez que qualquer desses itens não esteja presente, muito facilmente haverá convergência da situação para o caminho que tange os maus-tratos.

Os maus-tratos contra idosos, descritos pela primeira vez em 1975, na Inglaterra, têm sido tema explorado em pesquisas científicas e alvo de ações governamentais em todo o mundo e no Brasil, vigorosamente, desde a última década. Eles podem ser definidos como atos únicos ou repetidos – ou ainda ausência de ação apropriada que cause dano, sofrimento ou angústia – e que ocorram dentro de um relacionamento de confiança.

Na literatura especializada, os maus-tratos são usualmente classificados em: físico, verbal, psicológico ou emocional, sexual, econômico, negligência e autonegligência, levando para longe a ideia de que se trata apenas da agressão física. Os violentados sentem a agressão desde um simples xingamento até espancamento, enquanto quem agride nem sempre se conscientiza de que aquele ato já é um ato de violência, como deixar de trocar a fralda urinada ou simplesmente deixar de dar um copo de água ao idoso. Os cuidadores entrevistados entendem o que é violência contra idoso; mas será que eles não a cometem de alguma forma? Ocupar o cargo de cuidador em uma instituição de terceira idade por falta de opção (e não por afinidade) e não dar atenção e carinho ao interno mais carente já sugere violência.

A questão é que independentemente da forma de violência os idosos não costumam denunciar, por não conseguirem se locomover, por não terem contato com outras pessoas, por medo de maior agressão ou mesmo de abandono; e mesmo quando fazem a denúncia, ninguém acredita em seus relatos, pois eles não são considerados lúcidos o suficiente para dizerem verdades, e simplesmente são ignorados. Diante disso, exalta-se a importância da responsabilidade dos profissionais de saúde em detectar sinais de violência, orientar seus pacientes quantos aos tipos de apoio que eles podem recorrer e, principalmente, notificar a vigilância epidemiológica. Fernandes e Assis explicam que certos tipos de lesões e ferimentos frequentes no idoso, sua aparência descuidada, desnutrição, comportamento muito agressivo ou apático, afastamento, isolamento, tristeza ou abatimento profundo são sinais que merecem investigação. Quando se enfoca saúde global, as diferentes formas de violência contra o idoso comprometem sua qualidade de vida, acarretando somatizações, transtornos psiquiátricos e morte prematura, apontando que idosos vitimados por maus-tratos apresentam também uma taxa de mortalidade muito mais alta que a dos idosos que não sofreram abuso.

Outro fator relacionado a essa situação é o nível de estresse do cuidador, que também é significante fator de risco para maus-tratos contra idosos. Embora ainda se acredite que seja um fator contribuinte para a ocorrência de abuso, ele não responde, por si só, pela sua ocorrência. Mas se trabalhar com idosos causa tanto desgaste para quem presta este serviço, porque optar por ele? Os cuidadores explicaram que seria pelo interesse no emprego ou no salário, por ocupar a vaga por acaso, ou então por gostar.

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Vim trabalhar aqui por necessidade, não foi opção de trabalho, precisava complementar minha renda, estava desempregada. Estava precisando de funcionário e eu fiquei sabendo da vaga e trouxe meu currículo aqui. Vim por acaso, não porque eu tinha vontade de trabalhar com idosos, eu achava que era uma coisa ruim, aí me interessei em fazer isso e depois eu gostei, preferi ficar aqui com eles, depois me apeguei. É muita satisfa- ção em cuidar deles, me identifico muito. Tinha uma vontade muito grande de trabalhar com idosos e trabalhar aqui, meu Deus, não tem compara- ção. Gosto muito de cuidar dos velhinhos.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)23, em 2002 a média da taxa de desemprego aberto situou-se em 7,3%, o que é superior à média do período de janeiro a outubro de 2001 (6,3%). Dados como estes podem ser colhidos em qualquer jornal ou telejornal diário brasileiro; no entanto, mesmo com a política atual estável, não se consegue erradicar o desemprego, levando o cidadão a trabalhar no emprego disponível no momento, não necessariamente na sua área de formação.

A função do cuidador de idoso, seja um profissional qualificado, seja um simples voluntário que nunca teve qualquer tipo de formação, é um “cargo” que demanda muita disposição, paciência, atenção e capacidade de entendimento por parte de quem presta o serviço. A capacitação, o conhecimento e o treinamento são importantes no trabalho do cuidador. Saliba et al. destacam que as mudanças ocorridas na terceira idade levam o ancião, em muitos casos, a necessitar de alguém para auxiliá-lo, e quando não é fornecida capacitação ao profissional, resulta um desgaste tanto para o ser cuidado quanto para o cuidador. Esses autores ainda enfatizam que quem cuida trabalha pelos interesses de alguém e preocupa-se com esse alguém.

Os cuidadores entrevistados confirmaram estar no cargo por ser o único emprego que conseguiram. Considerando todos os pontos discutidos até agora, fica a dúvida se eles realmente estão preparados em prover o cuidado ao idoso institucionalizado, pois habilidades e virtudes, como a paciência, não fazem parte da índole de todos os seres humanos. Dessa forma, sugere-se que os internos estão mais vulneráveis aos maustratos, à falta de estímulo à manutenção da saú- de mental e à falta de cuidados específicos, quando o preenchimento do quadro de funcionários que lidam diretamente com o idoso (neste caso, os cuidadores) não exige seleção por qualificação e experiência profissional.

Quando as pessoas realizam atividades com as quais não têm afinidade ou habilidade, estas se tornam ocupações cansativas e estressantes, ficando muito aquém da excelência. Caldas ressalta que recebendo cuidado encontra-se um sujeito que tem uma dimensão existencial, sendo atingido pelos cuidados prestados pelo outro sujeito. Braun e Marcus alertam que os profissionais devem aprender uma nova filosofia quando forem tratar os pacientes idosos, mais do que um novo conjunto de habilidades clínicas e técnicas. Talvez uma seleção mais criteriosa pra tal cargo nas instituições possa contribuir para melhoria na qualidade de vida dos internos e menor desgaste para quem presta o cuidado. Brunetti e Montenegro afirmam que todo profissional envolvido no cuidado e no tratamento do idoso deve ter como objetivo de sua atuação a manutenção da identidade do indivíduo e a criação de condições que lhe permitam envelhecer graciosamente.

Dessa forma, o cuidador deve trabalhar oferecendo todo o benefício possível ao idoso. Mas o ato de cuidar de alguém gera alguns conflitos até mesmo pela diferença de personalidades entre os seres, e por isso os cuidadores foram questionados sobre as dificuldades que eles tinham no cuidado com o idoso. Destacaram que as maiores dificuldades são dar atenção necessária, ter insegurança, não haver compreensão.

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A dificuldade maior é atender eles na hora que eles querem. Eles começam a desabafar, contar que estão com saudade de alguém e eu não posso dar aquela atenção toda. Tem escassez de funcionário, tem que ter paciência com eles. Fico insegura na hora da alimentação, medo de engasgar, medo na hora do banho, de cair. Quando trabalho com os dependentes, não posso ajudar em algumas coisas como andar, enxergar… Quando eles ficam doentes, ficam muito frágeis. Saber a técnica é uma coisa, fazer funcionar é outra. A maior dificuldade é tentar fazer eles entenderem o que eu quero fazer. Muitas vezes eles não entendem.

É nítida a falta de cuidadores no quadro de funcionários das instituições, mas isso não justifica a falta de preparo dos entrevistados, principalmente quando se trata da insegurança no cuidado com o interno. A falta de compreensão desses cuidadores em relação à capacidade de entendimento de alguns internos pode levá-los a agir de forma rude e grosseira com o idoso. Eles entendem a fragilidade e a debilidade na saúde geral de alguns internos, mas não entendem que fornecer o cuidado ideal, dar carinho, amor e atenção são atitudes benéficas e confortantes ao ancião, uma forma de colaborar com o estado geral do idoso. Além disso, mesmo aqueles considerados “capacitados” por ter algum tipo de formação profissional, nem sempre já possuem experiência, pois eles mesmos relataram que é difícil colocar em prática todo o conhecimento (técnico) adquirido.

A falta de capacitação, de conhecimento e de prática do profissional que presta cuidados ao idoso gera insegurança, desorganização, irritação e falta de humanismo nele próprio. A maior vítima desse processo é o idoso que depende dos cuidados, pois não vai recebê-los adequadamente, o que prejudica seu bem-estar. A atenção aos simples gestos do ancião é fator que faz a diferença. Saber medicar e dar banho e alimentação nas horas certas não fazem da pessoa um profissional ideal para cuidar de idosos. É inegável a importância do conhecimento técnico, mas muito além do cateter existe um ser humano digno de respeito e cuidados especiais.

Esse respeito traz consigo a formação de elo entre as duas partes. Com isso, é possível que haja momentos bons durante todo o tempo de cuidados e atenção. Ao serem questionados sobre as satisfações que se adquiria ao cuidar de idosos, metade dos cuidadores não respondeu e a outra metade teve a mesma opinião: cuidar de idosos gera muita satisfação.

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 São muitas… eles me consideram e se apegam muito. Ficam alegres quando chego no serviço, não querem que eu vá embora, transmitem carinho, me proporcionam harmonia. É muito gratificante poder cuidar de uma pessoa e receber um sorriso, aprendo a valorizar as pessoas. Traz uma satisfa- ção muito grande de estar valorizando a minha vida hoje, promove bem-estar e é muito gratificante.

Para quem já tem habilidade, gosto por cuidar de pessoas e tem afinidade com idosos, o papel do cuidador traz muita satisfação. Embora os cuidadores entrevistados sintam-se de mãos atadas quando os anciãos possuem deficiências ou estão acamados, em outros momentos eles percebem que às vezes uma pequena atitude se torna imensa no entendimento do idoso. Desperta nesses cuidadores o afeto pelos internos, e a partir daí eles conseguem realizar o ato de cuidar com maior satisfação. O maior pagamento que o ancião pode oferecer a quem presta cuidados é o olhar de satisfação, suas histórias, experiência de vida, conselhos e os gestos de gratidão.

Depois da criação do relacionamento entre o cuidador e a pessoa que está sendo cuidada, inicia-se muitas vezes um laço afetivo. A partir desse laço, a relação diária passa a ficar menos exaustiva e mais satisfatória, pois através da vivência surgem descobertas e realizações que fazem com que ambos os lados sintam-se bem. Segundo Cattani e Girardon-Perlini, o cuidar apresentase como uma manifestação de afeto, uma concepção popular de amar, remetendo-nos a uma forma de compromisso com o outro. Os autores ainda exaltam que, nos casos de cuidadores que são filhos dos idosos, o ato de cuidar da própria mãe (ou do pai) transcende o ato em si, pois resgata o carinho, o amor, as desavenças do cotidiano e possibilita a retribuição de valores, de cuidados e também, de certa forma, o fato de existirem. Ao mesmo tempo, eles consideram as motivações que permeiam a tarefa de cuidar, e dessa forma observam que é evidenciada no cuidado uma forma de agradecimento pelas experi- ências vividas e pelos cuidados e atenção recebidos no passado.

Para os cuidadores que conseguem obter satisfações e enxergam recompensas nesse serviço, o próprio processo de envelhecimento pode ser mais saudável e mais tranquilo porque eles compreendem tudo o que acontece com cada idoso; no entanto, para os outros, “envelhecer” ainda é muito difícil, humilhante, principalmente por haver dependência física e financeira. Estes estão negligenciando a possibilidade de um dia se tornarem idosos e, pior, ignoram a hipótese de um dia compor o número de internos de um asilo, onde os profissionais não sejam qualificados, onde não haja ninguém para lhes dar atenção e carinho, onde no meio de tanta gente seja possí- vel sentir solidão. Não atentam para o fato de que um dia podem sentir-se bem e gratos por uma simples conversa com um cuidador mais atencioso e mais paciente. Para estes, ainda é preciso crescimento, ou então viverão a prática do medíocre pensamento de que chegar à terceira idade é tornar-se velho.

O envelhecimento na perspectiva do cuidador de idosos

Fonte: Garbin, Cléa Adas SalibaSUMIDA, Doris Hissako ; MOIMAZ, S. A. S. ; PRADO, Rosana Leal Do ; Silva, Milene Moreira da . O envelhecimento na perspectiva do cuidador de idosos. Ciência e Saúde Coletiva (Impresso), v. 15, p. 2941-2948, 2010.

Com o avançar da idade surgem sensíveis altera- ções no estilo de vida da população idosa, por problemas de saúde ou mesmo pelo processo fisiológico do envelhecimento, que se configura como um processo múltiplo e desigual de comprometimento e decadência das funções que caracterizam o organismo vivo em razão do tempo de vida .

O aumento da expectativa de vida e a diminuição da taxa de mortalidade representam um fenômeno mundial atualmente, acarretando o envelhecimento populacional e trazendo profundas consequências para as políticas sociais, representando um dos maiores desafios da saúde pública contemporânea.

No Brasil esse quadro não é diferente, e hoje o país já conta com mais de 14,5 milhões de idosos4 . Nessa perspectiva, estimativas indicam-no como sexto colocado em termos de população idosa no ano de 2025, com mais de 30 milhões de habitantes acima de sessenta anos.

As mudanças advindas da terceira idade levam os idosos, em muitos casos, a necessitar de alguém para auxiliá-los em atividades que antes pareciam de simples execução. Dessa necessidade surge a figura de cuidador de idosos, que em muitos casos passa-nos sob um olhar desatento e sem a devida capacitação, resultando em desgaste tanto para o ser cuidado quanto para o cuidador. Entretanto, hoje no país, pouco se conhece do impacto, sobre o sistema de saúde, de idosos que estão dependentes e necessitam de um cuidador. No Brasil, o cuidador não tem seu papel reconhecido, e tal lacuna é um fator a mais a ser considerado no planejamento de políticas públicas de saúde para idosos. Néri e Sommerhalder6 apontam a existência de uma incapacidade funcional como determinante da necessidade de um cuidador. Em países desenvolvidos, a figura do cuidador já é assimilada como parceira da equipe de saúde. Na Inglaterra, estima-se que mais de seis milhões de pessoas sejam cuidadores de indivíduos dependentes, em sua maioria idosos .

Sabe-se que essa parcela da população requer uma atenção especial em razão das condições sociais, mentais, físicas e afetivas nas quais vivem, em muitas das vezes situações de total abandono social8 . Portanto, pessoas que enveredam por essa área de atuação submetem-se, algumas vezes, a condições extremas de desgaste não só físico como emocional. Por isso, é de grande importância uma boa formação técnica fundamentada não só em conceitos teóricos como também em aspectos humanos e éticos.

Pouco se conhece sobre o perfil de cuidadores de idosos, suas necessidades, sua formação. A urgência de se estruturar uma equipe multidisciplinar qualificada com amplo conhecimento geriátrico e gerontológico é iminente, na busca da melhoria da qualidade de vida dos idosos institucionalizados. Este estudo se propõe relatar a percepção dos cuidadores de idosos que atuam em três instituições de amparo ao idoso na cidade de Araçatuba, São Paulo, em relação ao envelhecimento, suas motivações pessoais em buscar trabalho com essa parcela da população, seu relacionamento com o idoso, suas dificuldades durante o trabalho e a satisfação encontrada junto ao idoso.

Parte II

Ao analisar o relato gravado de todos os cuidadores, foram elaborados os discursos do sujeito coletivo de cada questão. Quando os profissionais (cuidadores) foram questionados sobre o significado de envelhecer, surgiram duas ideias centrais, indicando aspectos positivos e negativos do envelhecimento.

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 Eu costumo dizer que envelhecer é alguém na vida que tem muita experiência, sabedoria, é chegar numa idade avançada com saúde, mesmo velhinho fazendo tudo! É a realização de alguma coisa que você planejou, de bebê passa para criança, de criança pra adolescente, de adolescente para maior idade e daí, envelhecimento. É chegar numa idade feliz.

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Gostaria de não envelhecer, vai perdendo as forças, enfraquecendo. É um processo que não tem como evitar, da vida, que indica que o tempo chegou e nem sempre tem o amparo dos familiares. É difícil, humilhante, muito triste.

O primeiro tema explorado no DSC coincide com a opinião de Brunetti e Montenegro10, acreditando que o idoso ainda pode ser útil à sociedade com a experiência que acumulou durante a vida.

É possível ter saúde na terceira idade, com isso pode-se desfrutar do que a vida ainda proporciona, respeitando os limites do corpo, claro, porém não excluindo a chance de fazer o que lhe dá prazer. Borini e Cintra  ressalvam que participar das atividades de lazer em grupos de terceira idade representa a saída do fundo do poço, traz um sentido para a vida e o próprio renascimento. Então, usufruir de todos os avanços médico-tecnológicos e mesmo da própria mudança de conceitos da sociedade é uma forma de envelhecer com saúde, alegria e bem-estar, excluindo a imagem estereotipada de que com o envelhecimento o idoso fica acamado, à margem da sociedade.

Hazell et al. afirmam que exercícios físicos de resistência para adultos de maior idade, acompanhados de um profissional, são efetivos no aumento da força muscular, o que melhora a atuação dos idosos nas atividades diárias de vida. Isto quer dizer que se o idoso faz algum tipo de exercício físico diário, de preferência orientado por um profissional, ele não vai enfraquecer, pelo contrário: vai manter-se forte o suficiente para realizar suas atividades rotineiras e até outras, como a dança, por exemplo, o que lhe proporciona saúde e bem-estar e, consequentemente, melhoria na autoestima.

É certo que sexo, escolaridade, renda, proximidade com amigos e vizinhos, solidão, qualidade efetiva em relação à família, atividades de lazer, alimentação, cuidado corporal, deambula- ção, motilidade, estado mental, humor, acuidade visual, atividades domiciliares e extradomiciliares são variáveis que se mostram associadas à dependência dos idosos nos aspectos psicossociais e econômicos, aspectos emocionais e atividade de lazer e aspectos fisiopatológicos, como encontrado por Leite. O aspecto psicológico deve ser muito bem trabalhado com o idoso, pois muitas vezes existem, de fato, o abandono da família e a solidão, o que pode acarretam um estado depressivo. Segundo Irigaray e Schneider, a depressão é um dos problemas psiquiátricos mais comuns e importantes em idosos e caracteriza–se como um distúrbio da área afetiva ou do humor, que exerce forte impacto funcional em qualquer faixa etária. É de natureza multifatorial, que envolve numerosos aspectos de ordem biológica, psicológica e social, e vivenciada muitas vezes como tristeza, saudade, angústia e desânimo. No entanto, não é necessariamente uma morbidade integrante da velhice.

De nada adianta a família internar o idoso na melhor instituição de terceira idade se a saúde mental do ancião não é preservada. A saúde mental interfere muito na saúde geral, ao passo que, por mais que o idoso apresente todas as condi- ções de ter uma vida saudável e segura, se ele não tem carinho, diversão, emoção e alegria, não tem ânimo para desfrutar de nada. Essa é a situação que os cuidadores de idosos deste estudo observam de perto a cada dia de serviço. Eles têm a percepção de que a tristeza, a solidão e o abandono não permitem que dias ensolarados sejam bem aproveitados, que as flores do jardim tenham beleza e que o palhaço do circo tenha sua graça para o idoso esquecido, principalmente porque é dessa forma “triste e humilhante” que esses profissionais consideram o envelhecimento. A falta de ânimo leva o idoso a se abandonar, até o ponto de recusar a higiene do próprio corpo.

Mas existem tratamentos assistidos por profissionais que podem ajudar a envelhecer sem se ficar deprimido. De acordo com Moraes et al., a prática de exercícios físicos por indivíduos idosos depressivos sem comorbidades é capaz de promover a prevenção e a redução dos sintomas depressivos. Ou seja: a tristeza, a depressão, a solidão e a falta de exercícios físicos são fatores dependentes da força de vontade de cada individuo. Porém, em casos de pensamentos pejorativos, o idoso pode ser assistido por profissionais, tais como psicólogo, psiquiatra, fisioterapeuta, personal trainer, cirurgião-dentista, entre outros, para reverter o quadro e envelhecer com bemestar e qualidade de vida.

Um passeio matinal ou uma atividade artesanal acompanhados de pessoas queridas, brincadeiras com crianças e animais de estimação podem elevar o ponteiro da felicidade e isso garante a satisfação e o ânimo em viver, isto é: assim que se observa um comportamento pejorativo no ancião, deve-se estimulá-lo a realizar atividades que lhe proporcionem prazer e alegria, e esse estí mulo funciona melhor quando é dado por alguém por quem o idoso tenha muita estima. Alguns dos cuidadores entrevistados tentam preencher esse vazio, em um curto e raro tempo de folga durante o serviço. Em algumas das instituições-alvo desta pesquisa, foi possível observar que as atividades de lazer são mais frequentes e mais intensas; em outras, a visita de pessoas do terceiro setor (voluntariado), bem como o empenho delas em praticar artesanato e lazer com os internos, é o que mais lhes proporciona o bem-estar.

Em 2004, Gazalle et al. já alertavam que a depressão nos idosos era pouco investigada em ambientes clínicos e sugeriam que os médicos ficassem mais atentos aos sinais da doença e recebessem treinamento adequado no monitoramento de depressão nesse grupo etário. Mas além da depressão, as alterações fisiológicas, psicológicas, sociais e até as alterações de memória podem ser observadas diariamente no cuidado do idoso. Assim, é importante que o cuidador de idoso tenha principalmente habilidade e satisfação em trabalhar com o ancião, pois caso contrário não tem sensibilidade suficiente para enxergar e compreender tal situação, tampouco de observar a necessidade de cuidados específicos ou indicar profissionais especializados. Não ter noção do que é envelhecer é vendar os olhos para si no futuro. Talvez seja por essa suposta falta de interesse pessoal que, ao serem questionados sobre as maiores dificuldades do envelhecimento, os cuidadores tenham enfatizado as dificuldades físicas, psicológicas e aquelas encontradas durante o cuidado com o idoso.

 

Intervenções de enfermagem nas complicações mais frequentes durante a sessão de hemodiálise (Parte 2)

FONTE: NASCIMENTO, C. D. Intervenções de enfermagem nas complicações mais freqüentes durante a sessão de hemodiálise: revisão da literatura. Rev Bras Enferm 2005 nov-dez; 58(6): 719-22

Náuseas e vômitos

Náuseas e vômitos são ocorrências comuns e ocorrem em até 10% dos tratamentos rotineiros de diálise, sendo sua etiologia multifatorial. A maioria dos episódios em pacientes estáveis provavelmente esteja relacionada à hipotensão, mas também podem ser uma manifestação precoce da síndrome do desequilíbrio.

Deve-se tratar primeiramente a hipotensão, caso presente. Caso as náuseas e vômitos persistirem pode-se administrar um antiemético. É de extrema importância evitar a hipotensão durante a diálise. Em alguns pacientes, a redução da velocidade de fluxo sangüíneo em 30% durante a primeira hora de diálise pode ser benéfica. No entanto, o tempo de tratamento deve ser prolongado proporcionalmente.

Cefaléia

A causa da cefaléia é em grande parte desconhecida, podendo ser uma manifestação da síndrome do desequilíbrio ou relacionada à hipertensão arterial, assim como pode também estar relacionada à manifestação da abstinência de cafeína em pacientes que ingerem muito café, pois a diálise retira essa substância. Em geral a diálise pode induzir a cefaléia severa em conseqüência de uma quantidade grande de deslocamento da água e do eletrólito. O tratamento é realizado com o uso de analgésicos por via oral ou parenteral. Como para náuseas e vômitos, uma redução na velocidade de fluxo sanguíneo durante a parte inicial da diálise pode ser tentada.

Dor torácica e dor lombar

A dor torácica está frequentemente associada à dor lombar ocorrendo em 1-4% dos tratamentos de diálise. A causa é desconhecida, mas pode estar relacionada à ativação do complemento (uma função que envolve a estutura da Imunoglobulina e que ativa as respostas humorais). Não existe tratamento específico nem estratégia de prevenção, a não ser a troca para uma membrana sintética ou de celulose substituída (o fato de tal alteração ajudar ou não ainda é motivo de controvérsias). A ocorrência de angina durante a diálise é comum, e esta, assim como as numerosas outras causas potenciais de dor torácica, por exemplo, a hemólise, que deve ser considerada no diagnóstico diferencial. No caso da angina, existe relação direta com a redução da volemia que leva ao baixo débito cardíaco momentâneo. O mecanismo imediato de resposta é o aumento da secreção de epinefrina que induz a vasoconstrição coronariana.

Prurido

O prurido (coceira) é o sintoma de pele mais importante nos pacientes urêmicos. Em uma pesquisa, 80% dos pacientes submetidos à hemodiálise de manutenção apresentaram coceira em algum momento. No geral, o prurido foi frequentemente mais grave durante ou após uma sessão de hemodiálise.

O prurido, além de ser uma complicação durante a sessão de hoemodiálise, também é a manifestação mais comum nos portadores de IRC, e tem sido atribuído ao efeito tóxico da uremia na pele. As toxinas urêmicas circulantes são responsáveis pelo prurido, que pode desaparecer como o inicio do tratamento de hemodiálise; contudo, a terapia nem sempre alivia, podendo, inclusive, piorá-lo. Um produto cálcio-fósforo elevado pode contribuir para o processo. O prurido pode também estar associado à alergia a heparina e resíduos de óxido de etileno, por exemplo. Em alguns pacientes a sensação é tão intensa que causa escoriações na pele, crostas hemorrágicas, pústulas e formação de nódulos. Essas lesões ocorrem na face, nas costas, no tronco e nas extremidades.

Um grande número de tratamentos está em voga. Alguns tratamentos são eficazes como emolientes tópicos à base de cânfora, aplicação de ultravioleta, uso de carbonato de cálcio, quando o produto cálcio-fósforo for elevado e dieta para controle do fósforo, o uso de anti-histamínicos por via oral ou endovenosa e a paratireoidectomia está indicada para os pacientes com osteodistrofia e hiperparatireoidismo grave.

Febre e calafrios

O paciente renal crônico é imunodeprimido e, consequentemente, tem uma suscetibilidade aumentada para infecções. As infecções bacterianas nos pacientes renais crônicos parecem progredir de maneira rápida e a cura parece ser mais lenta. O loca de acesso é a fonte de 50% a 80% das bacteremias (principalmente pacientes com cateteres). As bacteremias podem causar endocardite, meningite e osteo-mielite.

Febre de baixa intensidade durante a hemodiálise pode estar relacionada a pirogênios presentes na solução dialítica e não a uma infecção verdadeira. O tempo de evolução da febre pode ser útil para a distinção entre reação pirogênica e infecção. Os pacientes com febre relacionada ao pirogênio são afebris antes da diálise, mas tornam-se febris durante a diálise; a febre desaparece espontaneamente após o término da diálise. Os pacientes com septicemia relacionada ao local de acesso frequentemente são febris antes da instituição da diálise, e, na ausência do tratamento, a febre persiste durante e após a diálise.

Nos pacientes que apresentam picos febris durante a hemodiálise deve-se verificar a temperatura do paciente e da máquina de hemodiálise, colher amostras de cultura, o uso de medicamentos como antitérmicos e antibióticos a critério médico e colher cultura da água para hemodiálise.

No caso de um tratamento de uma presumível infecção do acesso vascular em um paciente de diálise febril com cateter temporário (subclávio, jugular interno ou femoral), caso não exista fonte óbvia de infecção, devem ser realizadas culturas sangüíneas e também a remoção do cateter. O atraso na remoção de um cateter infectado pode resultar em complicações sépticas que poderiam ser evitadas

Hipertensão

A hipertensão durante a diálise é geralmente produzida por ansiedade, excesso de sódio e sobrecarga de líquidos. Isso pode ser confirmado comparando-se o peso do paciente antes da diálise com o peso ideal ou seco. Quando a sobrecarga hídrica é a causa da hipertensão, a ultrafiltração trará, geralmente, uma redução na pressão sanguínea, levando à normalização da pressão .

O temor, a ansiedade e a apreensão, podem produzir hipertensão passageira e errática. Após a administração de anti-hipertensivo, a enfermagem monitora a pressão arterial em intervalos freqüentes (geralmente de 15 em 15 minutos). Os sedativos podem ser necessários, mas a confiança na equipe e uma diálise suave, livre de problemas, ajudarão a reduzir a ansiedade durante ao tratamentos subsequentes.

Intervenções de enfermagem nas complicações mais freqüentes durante a sessão de hemodiálise (Parte 1)

FONTE: NASCIMENTO, C. D. Intervenções de enfermagem nas complicações mais freqüentes durante a sessão de hemodiálise: revisão da literatura. Rev Bras Enferm 2005 nov-dez; 58(6): 719-22

 

A Insuficiência Renal Crônica (IRC) refere-se à perda progressiva e irreversível da função renal. Se não houver tratamento, levará o paciente a morte. A IRC pode ser tratada por meio da hemodiálise em pacientes selecionados, cujo principal critério é ter uma função cardíaca estável.

A hemodiálise é o processo de filtragem e depuração do sangue de substâncias indesejáveis como a creatinina e a uréia que necessitam ser eliminadas da corrente sangüínea humana devido à deficiência no mecanismo de filtragem nos pacientes portadores de IRC. Na hemodiálise, a transferência de solutos ocorre entre o sangue e a solução de diálise através de uma membrana semi-permeável artificial (filtro de hemodiálise ou capilar) por três mecanismos: a difusão, que é o fluxo de soluto de acordo com o gradiente de concentração, sendo transferida massa de um local de maior concentração para um de menor concentração, isso depende do peso molecular e características da membrana. A ultrafiltração é a remoção de líquidos através de um gradiente de pressão hidrostática e a convecção é a perda de solutos durante a ultrafiltração, quando ocorre o arraste de solutos na mesma direção do fluxo de líquidos através da membrana.

Atualmente, obtem-se um grande progresso em relação à segurança e a eficácia das máquinas de hemodiálise, tornando o tratamento mais seguro. Existem alarmes que indicam qualquer alteração que ocorra no sistema (detectores de bolhas, alteração de temperatura e do fluxo do sangue entre outros), mesmo assim, isso não garante que as complicações deixem de ocorrer.

As complicações que ocorrem durante a sessão de hemodiálise podem ser eventuais, mas algumas são extremamente graves e fatais. A equipe de enfermagem tem importância muito grande na observação contínua dos pacientes durante a sessão, podendo ajudar a salvar muitas vidas e evitar muitas complicações ao fazer o diagnóstico precoce de tais intercorrências. O paciente deve ter extrema confiança nos profissionais prestativos, atenciosos e que estão sempre alerta para intervir quando necessário.

O entendimento do que vem ser uma diálise adequada vem sofrendo mudanças ao longo dos anos. Se nos primórdios da diálise poderia ser razoável ter como objetivo evitar a morte por hipovolemia ou hipervolemia, hoje o tratamento dialítico busca a reversão dos sintomas urêmicos e, a diminuição do risco de mortalidade, a melhoria da qualidade de vida e a reintegração social do paciente.

A partir de observações empíricas, os autores do presente trabalho pontuam que a enfermagem é o grupo profissional que mais participa diretamente no processo de que envolve a hemodiálise, incluindo a atuação na resolução de possíveis complicações.

A frequência das complicações é grande. Atualmente a hemodiálise busca a reversão não somente dos sintomas urêmicos, mas também a redução das complicações que são inerentes ao próprio procedimento e a diminuição do risco de mortalidade. Por este motivo os profissionais de enfermagem devem estar sempre atualizados para promover um tratamento com segurança e qualidade ao paciente renal crônico. Neste texto identificaremos as complicações mais freqüentes durante a hemodiálise, correlacionando-as com as intervenções de enfermagem.

 

Complicações durante a sessão de hemodiálise e a atuação da enfermagem

As complicações mais comuns durante a hemodiálise são, em ordem decrescente de frequência, hipotensão (20%-30% das diálises), cãibras (5%-20%), náuseas e vômitos (5%-15%), cefaléia (5%), dor torácica (2%-5%), dor lombar (2%-5%), prurido (5%), febre e calafrios (< 1%). As complicações menos comuns, mas sérias e que podem levar à morte incluem: a síndrome do desequilíbrio, reações de hipersensibilidade, arritmia, hemorragia intracraniana, convulsões, hemólise e embolia gasosa.

Hipotensão

A hipotensão é a complicação mais frequente durante a hemodiálise, sendo um reflexo primário da grande quantidade de líquidos que é removida do volume plasmático durante uma sessão rotineira de diálise. A água acumulada no intervalo interdialítico é retirada diretamente pelo mecanismo de ultrafiltração.

Quando o ritmo de ultrafiltração ultrapassar a capacidade de reenchimento vascular, ocorrerão hipovolemia e hipotensão arterial. Em geral, as causas comuns da hipotensão durante a hemodiálise são: flutuações na velocidade de ultrafiltração, velocidade de ultrafiltração alta, peso seco almejado muito baixo, medicamentos anti-hipertensivos, superaquecimento da solução de diálise, ingestão de alimentos, neuropatia autônoma, isquemia tecidual, disfunção diastólica, freqüência cardíaca e contratilidade. Os sintomas variam de tontura e sensação de desfalecimento, náuseas, calor e sudorese, dificuldades respiratórias e cãibras musculares, bocejos freqüentes, dor precordial, palidez cutânea, apatia, confusão mental e taquicardia.

A intervenção consiste em iniciar imediatamente o tratamento de episódios agudos de hipotensão. O paciente deve ser colocado em posição de Trendelemburg, deve ser administrados bolus de 100 ml de SF a 0,9% ou mais se necessário, a velocidade de ultrafiltração deve ser reduzida para o mais próximo possível de zero. Intervenções de enfermagem como o monitoramento cuidadoso dos sinais vitais e observação de sintomas específicos podem ajudar a limitar a ocorrência e a intensividade de episódios hipotensivos nesses pacientes.

Cãibras musculares

As cãibras musculares durante a hemodiálise acontecem quando os líquidos e eletrólitos deixam rapidamente o espaço extracelular. Os fatores predisponentes mais importantes são: hipovolemia e hipotensão. Geralmente as cãibras ocorrem juntamente com a hipotensão, embora possam persistir após o restabelecimento da pressão arterial. No paciente abaixo do peso seco, as cãibras intensas e persistentes podem ocorrer quando o mesmo é desidratado até níveis inferiores ao seu peso seco. O uso de solução dialítica pobre em sódio também tem sido associada a uma alta incidência de cãibras musculares.

Como geralmente as cãibras musculares ocorrem concomitantemente com a hipotensão, a administração de solução de glicose ou soro fisiológico hipertônico é muito eficaz no tratamento agudo das cãibras musculares, podendo também ser utilizado gluconato de cálcio. Essas soluções também agem transferindo água osmoticamente em direção ao compartimento sangüíneo, auxiliando a manter o volume sangüíneo. A administração de glicose hipertônica é preferida para o tratamento de cãibras em pacientes não-diabéticos.

A prevenção dos episódios hipotensivos eliminaria a maior parte dos episódios de cãibras. A elevação do nível de sódio do banho da diálise também pode ajudar a evitar os episódios de cãibras musculares durante e após o tratamento.